LIMITES E POSSIBILIDADES DE UMA PEDAGOGIA PARA A MODERNIDADE LÍQUIDA

Solange Franci Raimundo Yaegashi
Robson Borges Maia
Teresa Kazuko Teruya
Luciana Maria Caetano
Luciane Guimarães
Batistella Bianchini

RESUMO

Este trabalho, de caráter teórico descritivo, tem comoobjetivo identificar as características queuma teoria pedagógica deve terpara atender às demandas que recaem sobre aeducaçãoescolar.Para tanto, analisamos as principais mudanças que ocorreram nas práticas pedagógicas durante o século XX e refletimos sobre o momento histórico em que vivemospara identificar a pedagogia que desponta na nossa sociedade. Concluímos que momentos de crise são também geradores de novas oportunidades e apontamos uma série de qualidades indispensáveis às teorias pedagógicas do século XXIamparados na leitura de Bauman sobrea modernidade líquida.

Palavras-chave: Teorias Pedagógicas; Pedagogia;Modernidade líquida.

LIMITS AND POSSIBILITIES OF A PEDAGOGY FOR THE LIQUID MODERNITY

ABSTRACT
The main aim of thistheoretical-descriptive work is to identify the characteristics that a pedagogical theory must beto meet the demands which fall on the school education. Therefore, we analyzed the main changes that occurred in the pedagogical practice during the twentieth century and reflected about the historical moment we live in, in order to identify thepedagogy that rises over our society.We concluded that moments of crisis are also generators of new opportunities and we pointed some indispensable qualities to the pedagogical theories from the twenty-first century, supported by Bauman’sviews about the liquid modernity.

Keywords: Pedagogical Theories;Pedagogy;LiquidModernity.

Introdução

O acelerado desenvolvimento científico e tecnológico das últimas décadas trouxe vários benefícios e facilidades para a vida em sociedade. No entanto, esses avanços vêm promovendo transformações sociais tão velozes e profundas que têm deixado as nossas instituições com uma sensação de desorientação pela incapacidade de assimilar o ritmo das mudanças e pela perda dos referenciais culturais estabelecidos.

No interior de nossa própria cultura, sem sair de nossa própria cidade nem de nosso próprio bairro, um belo dia observamos nosso ambiente e nos damos conta de que tudo mudou tanto que mal somos capazes de saber como as coisas funcionam. Sentimo-nos, então, desorientados, tão desorientados como se tivéssemos viajado para uma sociedade estranha e distante, mas sem esperança de voltar a recuperar aquele ambiente2584234conhecido no qual sabíamos nos arranjar sem problemas (ESTEVE, 2004, p. 24).

Estamos no  meio  da  travessia  de  um  modelo  societário  a  outro,  e  como  bem pondera Marcondes (1996, p. 29), “o verdadeiro sentido do momento pelo qual estamos passando só pode ser estabelecido e avaliado a posteriori, em retrospecto, quando e se, de acordo com a terminologia de Kuhn, se instaura um novo contexto de normalidade”.

A escola, como uma das principais instituições da nossa sociedade, não ficou imune a essas mudanças. Ela busca reinventar-se, reconstruir-se, redefinir-se no seu o papel social em um mundo em que quase tudo ao redor é mais interessante que a sala de aula. Não só os conteúdos  (o  que  ensinar)  estão  sendo  questionados,  mas  também  os  métodos  (como ensinar) encontram-se no centro das discussões sobre o futuro da educação escolar.

É  nessa  busca  que  analisamos  e  refletimos sobre  as  principais  teorias  pedagógicas do  século  XX  para  responder ao  seguinte  problema  de  pesquisa:  que  características deve ter uma teoria pedagógica para atender às demandas que recaem sobre a educação escolar no século em que vivemos?

Essa   problemática é investigada   tendo   como   referência   as   obras   de autores contemporâneos  como Harvey  e  Bauman, que apesar  de não elegerem como  objeto  de análise central em suas obras a educação escolar, nos auxilia nessa tarefa de caráter teórico descritivo. Portanto, nosso objetivo é identificar as   características que uma teoria pedagógica deve  ter para  atender  às  demandas da escola da  modernidade  líquida,  como Bauman (2010) denomina o nosso momento histórico. Para isso, analisamos as principais mudanças  que  ocorreram  nas  práticas  pedagógicas  durante  o  século  XX,  elencando algumas  características  fundamentais  de cada  uma  dessas  práticas por  entendermos  ser indispensável para a compreensão do nosso objeto de estudo.

Em seguida, refletimos sobre o momento histórico em que vivemos, em um esforço para  identificar como  deveria  ser  a  pedagogia  mais  adequada  para  esse  início  de  século, cientes  de  que  mudanças  profundas deverão ocorrer se  a  escola  quiser  sobreviver  como instituição responsável pela formação das novas gerações.

Na  conclusão,  discorremos acerca  da importância  dos  momentos  de  crise como geradores de novas oportunidades, a partir das quais podemos transformar a atual realidade educacional.

As principais teorias pedagógicas do século XX

No dicionário Houaiss (2015, s/p) consta que pedagogia é um substantivo feminino, introduzido em nossa língua em 1813, com o significado de “ciência que trata da educação dos jovens, que  estuda  os  problemas  relacionados  com  o  seu desenvolvimento  como  um todo”. Por extensão de sentido, a pedagogia é o “conjunto de métodos que asseguram a adaptação recíproca do conteúdo informativo aos indivíduos que se deseja formar”.

Esmiuçando essa última definição,  aprofundamos nossa  reflexão  sobre  os  termos indivíduo e conteúdo informativo. Ambos os termos transformam-se a cada nova geração. Um  saber  que  era  útil  e  indispensável  em  um  determinado  momento  do  nosso  processo civilizatório pode  perder  completamente  sua  utilidade  e importância  em  outro  momento. No  tocante  ao  indivíduo,  temos  consciência  de  que  cada período  da história demanda  um indivíduo   específico,   formado em   consonância   com   os valores   e as necessidades predominantes em seu tempo e espaço social.

Etimologicamente,   pedagogia   vem   do   grego paidogogós,   junção   de paidós (criança)   com agogôs (guia,   condutor). Paidogogósera,   portanto,   o   escravo   que acompanhava a criança à escola. Esse termo “assumiu posteriormente conotações abstratas para  indicar  as  teorias sobre a educação” (ARANHA,  2006,  p.  34),  que  se materializa no ato pedagógico, definido por Libâneo (1985)como uma atividade sistemática de interação entre seres sociais, visando a mudanças tão eficazes que os tornem elementos ativos dessa própria ação exercida.

O  ato  pedagógico  é  uma  especificidade  do  ato  comunicativo e,  como  tal,  é composto necessariamente por três elementos: o agente emissor que ensina, que pode ser o professorou a professora, um grupo ou a comunidade; a mensagem a ser transmitida, que pode  ter  cunho  cognitivo,  afetivo  ou  motor; e a  pessoa receptora,  ou  seja,  o  aluno ou  a aluna, uma turma em uma sala de aula  e até mesmo toda uma geração.  Por essa razão, as teorias pedagógicas  só  podem  ser  compreendidas em um  determinado  contexto  sócio histórico, posto  que é  uma característica das  sociedades  humanas a transformação  no transcorrer do tempo(ARANHA, 2006).

Tendo o  ato  pedagógico  como  referência, neste tópico  analisamos  as  principais teorias pedagógicas do período   republicano   do   Brasil, focando   nossa   atenção   nas características  da relação entre docente  e  discente desse  período por  entendermos  que  a compreensão histórica das mudanças que se deram nessa relação é o primeiro passo para a recuperação da nossa memória

A pedagogia tradicional

O Brasil República,  nascido  no  final  do  século  XIX,  iniciou uma  gradativa passagem  do  modelo  agrário-exportador  para  o  modelo  urbano-exportador.  Nessa  fase, surgia nos  países  centrais  da  Europa  a  escola  pública,  laica,  gratuita  e  universal,  com a finalidade de implantar um sistema de crenças e valores adequados à sociedade industrial.

Criada  para  suprir  as  necessidades  da  organização  produtiva  industrial,  a  escola tornou-se também uma necessidade social e um meio para disseminar a visão burguesa do mundo e assim consolidar a burguesia industrial como classe dominante. O conhecimento deveria  então  ser  transmitido  por  meio  da  escola  e  aqueles  que  se  apropriassem  do conteúdo  escolar  estariam  aptos  a  viver em  uma sociedade em  que  a prosperidade  e  a riqueza estariam diretamente relacionadas à posse e aplicação dos conteúdos escolares.

Segundo  Saviani  (1987),  a  concepção  filosófica  de  educação  predominante  nesse período  foi a concepção “humanista” tradicional, que vê a  educação  como  algo  tributário de determinado “sistema filosófico” geral. Havia uma  visão  essencialista  de ser  humano, tido como possuidor de uma essência imutável. De acordo com essa concepção, a educação deveria conformar-se à essência humana, pois nela não havia lugar para a inovação.

A escola tradicional no Brasil inspirou-se na pedagogia do filósofo alemão Johann Friedrich  Herbart  (1776 -1841)  e  do  educador  suíço  Johann  Heinrich  Pestalozzi  (1746 -1827).A extensa literatura herbartiana, publicada nos EUA, chegou ao Brasil na transição do  século  XIX  para  o  século  XX por  intermédio  de  intelectuais  ligados  às  oligarquias dirigentes e à Igreja (GHIRALDELLI JUNIOR,1994).

Acoplada ao culto, ao rigor, à disciplina, à forma e à organização curricular oriunda do positivismo e do iluminismo, a pedagogia herbartiana forneceu o corpo principal do que chamamos  hoje  no  Brasil  de  escola  tradicional  (GHIRALDELLI  JUNIOR,  1994).  Nesse período,  a  educação  era  concebida  como  instrução,  caracterizada  pela  transmissão  de conhecimentos  a  ser  realizada  única  e  exclusivamente  na e  pela escola.  O  conhecimento provinha do meio e deveria ser transmitido ao indivíduo na escola pelo método herbartiano dos  cinco  passos:  preparação,  apresentação,  associação,  generalização  e  aplicação.  As diferenças   individuais   não   eram   respeitadas,porque buscava   a   padronização   do conhecimento e a homogeneização das condutas.

Conforme Hilgenheger (2010),  na  escola inspirada  em  Herbart, o  ensino  era centrado no professore voltava-se para o que era externo ao aluno tais como o programa e as disciplinas. A relação na sala de aula ocorria de forma vertical, cabendo ao professora decisão  sobre  o  que,  quando  e  como  ensinar,  com  o  predomínio  do  autoritarismo  e  do distanciamento. Aos alunos cabiam apenas executar a determinação do professor, de modo obediente e passivo.

Freire (1987), no livro Pedagogia do Oprimido, escrito em 1968 durante seu exílio no Chile, chamou de “educação bancária” esse modelo de ensino em que o aluno e a aluna eram concebidos como uma  “caixa” de  depósito.  Nessa  concepção, o  professor ou a professora depositava o conhecimento no aluno. Quanto maior a quantidade de conteúdos depositados, melhor seria  o  ensino,  já que o  aluno ou  a  aluna  teria  uma  educação  melhor com  a  cabeça  cheia  de  conhecimentos  adquiridos  na  instituição  escolar. Desse modo, a formação escolar assegurava a permanência de posições fixas. O professor ou a professora era a pessoa detentora do saber, enquanto o aluno ou a aluna deveria aprender.

Fernández  Enguita  (2004)  aponta  que  na  escola  tradicional  a  criança  aprendia,  de modo  sistemático,  uma  série  de  novidades  tendo  sempre  em  vista  a  adaptação  à  nova ordem  social  eminentemente  industrial. Para  inserir-se na  sociedade na  nova  ordem  era preciso   submeter-se   a   uma   autoridade   impessoal   e   burocrática;   aceitar   que   outros decidissem por elas o que fazer, como fazer, quando e em que ritmo; competir de maneira destrutiva;  aceitar  uma  estrutura  social  desigual  e  estratificada;  manter  uma  atividade regular  e  continuada  independentemente  de  seu  estado  de  ânimo  e  desenvolver  novos hábitos  de  conduta. Essas eram algumas  das  características  das  relações  sociais  que  se davam  na  escola  e  que  expressavam,  até  certo  ponto,  as  relações  sociais  próprias  da sociedade industrial.

Entretanto,  novas  necessidades  sociais  foram  surgindo,  a  partir  das  quais  novas formas  de  trabalho  e  novas  instituições  foram  sendo  inventadas. No  Brasil,  a  república velha  agonizava.  Enquanto  nos  países  desenvolvidos  a  segunda  revolução  industrial caminhava  a  pleno  vapor,  nosso  país  ainda  não  havia  concluído  a  passagem  do  modelo agrário-exportador  para  o  modelo  industrial  urbano-exportador.  Na   década  de  1920 educadores  pátrios  iniciam  um  movimento  na  tentativa  de  criar  um  sistema  educacional para a Nação, que até então era considerado inorganizado, fato que marcou o início de um novo momento na história das tendências pedagógicas em terras brasileiras.

A pedagogia escolanovista

Inspirado  na  obra  do filósofo  norte-americano John  Dewey  (1859-1952), foi publicado  o  Manifesto  dos Pioneiros da  Educação  Nova em 1932,  tendo  como  principais signatários Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira e Lourenço Filho, dentre um total de 26 educadores. A  educação  brasileira  passou  a  viver  um  clima  de  grandes  expectativas, decorrentes  das  mudanças  que se  operavam  nos  campos  político,  econômico  e  cultural. Discorrendo  sobre este Manifesto de  1932,  Aranha  (2006) lembra que em  um mundo marcado  por  profundas  transformações, a   função  da  escola  era preparar  o  indivíduo  para uma sociedade dinâmica.

O  movimento  educacional  conhecido  como  Escola  Nova  surgiu  no  final do  século  XIX  justamente  para  propor  novos  caminhos  à  educação,  em descompasso  com  o  mundo  no  qual  se  achava  inserida.  Representa  o 2584237esforço   da   superação   da   pedagogia   da   essência  pela   pedagogia   da existência (ARANHA, 2006, p. 225).

Dewey se opôs à pedagogia tradicional, dentre outras razões, por ela não relacionar as disciplinas do programa de estudos com os interesses da criança(WESTBROOK, 2010).

Dewey  pedia  aos  educadores  que  integrassem  a  Psicologia  ao  programa de estudos, construindo um ambiente em que as atividades imediatas dos alunos    se    confrontem    com    situações    problemáticas    que    exijam conhecimentos   teóricos   e   práticos   da   esfera   científica,   históricos   e artísticos, para resolvê-las (WESTBROOK, 2010, p. 18).

Para Saviani (1987), a concepção filosófica de educação que se encontra na base do chamado movimento da escola nova é a concepção “humanista” moderna, que abrange, dentre   outras   correntes,   o   pragmatismo,   o   historicismo,   o   existencialismo   e   a fenomenologia. A  concepção  humanista  moderna é centrada  na  existência, que precede  a essência  e dá  à natureza  humana um  caráter mutável. O ser humano  é complexo e inacabado, por  isso o  ensino  é  centrado  no aprendiz e  não em  quem  ensina, como  na concepção   tradicional.   Ao invés   de   seguir   uma   ordem   lógica,   segue   uma   ordem psicológica. Ao invés de subordinar os meios aos fins, subordina os fins aos meios.

A  escola  nova  concebe  a  educação em seu  sentido  mais  amplo,  como  formação humana e não apenas como a educação que se processa na escola. A educação tem por fim a  “aprendizagem  que  abranja  conceitos  e  experiências,  tendo  como  pressuposto  um processo de aprendizagem pessoal”(MIZUKAMI, 1986, p. 45). A escola decorrente de tal concepção  coloca o aprendiz no  centro  do  processo de  ensino  e  de  aprendizagem,  razão pela qual:

Essa abordagem dá ênfase às relações interpessoais e ao crescimento que delas   resulta,   centrado   no   desenvolvimento   do   indivíduo,   em   seus processos  de  construção  e  organização  pessoal  da  realidade,  e  em  sua capacidade  de  atuar,  como  uma  pessoa  integrada.  Dá-se  igualmente ênfase à vida psicológica e emocional do indivíduo e à preocupação com a sua orientação interna, com o autoconceito, com o desenvolvimento de uma visão autêntica de si mesmo, orientada para a realidade individual e grupal (MIZUKAMI,1986, p. 37-38).

Na relação pedagógica que se estabelece nasala de aula, o papel da docência é ode “facilitar  a aprendizagem”,  possibilitando  o  contato  com  as  dificuldades  existenciais e individuais.  Assim,  o  relacionamento no  espaço  escolar  prioriza  a  construção  deum ambiente  democrático  e  acolhedor,  onde  o  professorou  a  professora  trabalha  com  as características  individuais  de  cada aprendiz. Este,  por  seu turno,  desempenha  o  papel central  no  processo de ensino e  de aprendizagem, razão  pela  qual  essa  pedagogia  é considerada pedocêntrica (ARANHA, 2006).

Quem aprende é um sujeito ativo e tem a responsabilidade pelo aprendizado que se dá  pela  descoberta.  Assim,  cada aprendiz se  desenvolve  de  acordo  com  suas  próprias capacidades e recursos em função da sua ação e esforço individual. “O diretivismo no ensino,   característico   das   abordagens   predecessoras,   é   aqui   substituído   pelo   não-diretivismo:  as  relações  verticais  e  impostas,  por relação  EU-TU  e  nunca  EU-ISTO”(MIZUKAMI, 1986, p. 31).

A pedagogia tecnicista

Três  décadas  após  a  publicação  do  Manifesto  dos  Pioneiros  da  Educação  Nova,  o Brasil  passou  por  outro  golpe  de  Estado,  dado  em  1964  pelos  militares,  que  modificou radicalmente  a  estrutura  e  o  funcionamento  da  educação  pátria.  A  partir  dessa  década, a educação    brasileira conheceria    a    pedagogia tecnicista, inspirada    na    teoria    do condicionamento operante do psicólogo norte-americano BurrhusFrederic Skinner (1904-1990). Para ele, a educação, o processo de ensino e aprendizagem e a instrução significam arranjos  de  contingências  que  possibilitam  a  transmissão  cultural,  fim  último  de  todo  o processo educacional (MIZUKAMI, 1986).

Ressalvamos, todavia, que no Brasil, a passagem do paradigma escolanovista para o tecnicismo  não ocorreu única  e  exclusivamente  por  força  do  regime  militar.  Nos  países centrais, um  novo  modo  de  produção surgia,  determinando  novas  formas  de  trabalho e, consequentemente, dando origem a novos moldes de relacionamento humano. Na segunda metade  do século  XX,  o  mundo  desenvolvido  viu  nascer o modelo  de  produção  e  de sociedade  que  Harvey  (1992) denominou  condição  pós-moderna e  Bauman  (2010; 2013) modernidade líquida.

Deste  modo, educação escolar  brasileira foi redirecionada para  uma  concepção  de ensino  que  enfatizava  a  organização  racional  dos  métodos  pedagógicos,  privilegiando  os processos  metodológicos  em  detrimento  da  própria  aquisição  do  conhecimento  que  se  dá pela aprendizagem.

O   pressuposto   que   embasou   esta   pedagogia está   na   neutralidade científica,   inspirada   nos   princípios   de   racionalidade,   eficiência   e produtividade.   Buscou-se   a   objetivação   do   trabalho   pedagógico   da mesma  maneira  que  ocorreu  no  trabalho  fabril.  Instalou-se  na  escola  a divisão  do  trabalho  sob  a  justificativa  de  produtividade,  propiciando  a fragmentação  do  processo  e,  com  isso,  acentuando  as  distâncias  entre quem planeja e quem executa (VEIGA, 1989, p. 34-35).

De  acordo  com Saviani  (1987),  a  escola  tecnicista  está  relacionada  à  concepção analítica  de  Filosofia  da  Educação, a  qual não  pressupõe  explicitamente  uma  visão  de homem  nem  um  sistema  filosófico  geral.  Na  concepção  analítica,  a  tarefa  da  Filosofia  da Educação é efetivar a análise lógica da linguagem educacional pela lógica informal. Não é tarefa sua produzir enunciados e muito menos práticas.

Corroborando Veiga  (1989),  a  escola  tecnicista  se  caracteriza  por  uma  excessiva preocupação  com  a  eficácia  e  a  eficiência  do  processo  de  ensino,  razão  pela  qual  os aspectos  mensuráveis  e  observáveis  são extremamente  valorizados.  Toda  estratégia  de ensino  deve  ser  fundamentada  nos  princípios  da  tecnologia  educacional.  Assim,  o  ensino compõe-se   de   padrões   de   comportamento   que   podem   ser   mudados   por   meio   de condicionamentos  baseados  em  categorias  de  comportamento  e  em  habilidades  a  serem desenvolvidas.

Para Saviani  (1985,  p.15),a escola tecnicista se propôs a “planejar a educação de modo a dotá-la de uma organização radical capaz de minimizar as interferências subjetivas que pudessem pôr em risco sua eficiência”. Nessa perspectiva, o elemento fundamental da escola  tecnicista  passa  a  ser  a  organização  racional  dos  meios,  ao  contrário  da  escola tradicional,  que  tinha  no  professorou  na  professora  o elemento central do  processo  de ensino e de aprendizagem, e da escola nova, na qual o aprendiz ocupava a posição central nesse processo.

Mizukami(1986,  p.31)  assinala  que na  pedagogia  tecnicista “o professor[ou  a professora]teria  a  responsabilidade  de  planejar  e  desenvolver  o  sistema  de  ensino- aprendizagem,  de  forma  tal  que  o  desempenho  do  aluno [ou  da  aluna] seja  maximizado, considerando-se igualmente fatores tais como economia de tempo, esforços e custos”.

O trabalho  docente passa  a  ser  considerado, por  conseguinte, um  trabalho  de engenharia comportamental, capaz de arranjar  as  contingências  de  reforço  de  modo  a possibilitar a ocorrência  de uma resposta  a ser aprendida. O aluno e a  aluna submetem-se ao que foi racionalmente planejado para obter a resposta desejada. É um mero expectador da  realidade  objetiva,  já  que  a  aprendizagem  decorre  da  aquisição  dos  comportamentos desejáveis. Exigem-se respostas prontas e corretas, o que o torna condicionado e acrítico.

Em  suma,  nessa  concepção  de  escola  o  relacionamento docente-discente fica  em segundo  plano,  pois ambos deixam  de  ser  os  elementos  fundamentais  do  processo  de ensino e de aprendizagem. Na escola tecnicista, “o processo é que define o que professores [professoras] e  alunos[alunas]devem fazer, quando e como o farão”(VEIGA,  1989,  p. 35).

Os defensores do tecnicismo argumentavam que:

O  país  deveria  fazer  progredir  a  qualidade  da  mão-de-obra  nacional através  de  uma  rede  de  ensino  voltada  para  a  capacitação  técnica  do trabalhador[e  da  trabalhadora].  Cada  homem[cada  mulher],uma  vez tendo aumentado o seu “capital humano” -sua  capacitação  técnica  de trabalho  especializado -,  poderia  produzir  mais  e  melhor  e  contribuir  de maneira   mais   efetiva   para   o   desenvolvimento   econômico   do   país (GHIRALDELLI JUNIOR, 1994, p. 186).

 Com essa pedagogia, o regime militar reduziu a educação a mero fator econômico de produção, dirigida aos interesses do capital. A escola tecnicista tinha a função de formar indivíduos para o sistema produtivo, perdendo de vista a especificidade da ação educativa. A pedagogia tecnicista,  portanto,  almejava  uma  formação acrítica  e  eficaz  para  tornar indivíduos condicionados,  pois  ao  trabalho  docente competia  apenas  seguir  à  risca as recomendações  dos  manuais  e dos  livros  didáticos.  Por  fim,  esse  esforço  educacional consistia em desenvolver a competência técnica do aluno e da aluna.

As pedagogias libertadora e histórico-crítica

No final da década de 70 do século XX, organizava-se no Brasil uma concepção de educação  que  postulava  a  superação  das  desigualdades  sociais  a  partir  das  contradições presentes  no  modo  de  produção  flexível. Tal  concepção  foi  representada  pela Pedagogia Libertadora  e pela Pedagogia  Histórico-Crítica, que tiveram como  principais  expoentes Paulo Freire e Dermeval Saviani.

Essas  correntes  pedagógicas,  colocadas  na  clandestinidade  pelo  regime  militar,  só se  tornaram  conhecidas  do  grande  público  a  partir  da  década  de  80  do  século  XX,  graças aos movimentos sociais que pediram o fim ditadura, que já durava duas décadas. Síntese de diversas   correntes   de   pensamentos,   tais   como   o   humanismo,   a   fenomenologia,   o existencialismo  e  o  marxismo,  essas  pedagogias  procuraram elaborar  uma  proposta  de educação que se  tornasse, para  as  camadas  dominadas  da  sociedade,  instrumento  útil  na luta pelas transformações sociais e projetassem uma sociedade cada vez menos desigual e mais inclusiva.

Assim, a concepção dialética de educação escolar busca

[…]superar  o  intelectualismo  formal  do  enfoque tradicional,  evitar  os efeitos    do    espontaneísmo escolanovista,    combater    a    orientação desmobilizadora  do tecnicismo e  recuperar  as  tarefas  especificamente pedagógicas,  desprestigiadas  a  partir  do  discurso  reprodutivista.  Procura ainda,  compreender  e  analisar  a  realidade  social  onde  está  inserida  a escola(VEIGA, 1989, p. 39-40, grifos nossos).

Adentramos, portanto, no século XXI recriando a nossa ordem social transformada pelas décadas de regime militar, enquanto Europa, Japão e Estados Unidos já se rendiam à  flexibilização  da  produção.  Era  preciso,  mais  uma  vez,  encontrar  uma  pedagogia  que atendesse aos   novos   ditames   do   paradigma   flexível. Do   currículo   aos   métodos pedagógicos, da estrutura e organização do ensino à formação de professores e professoras, tudo precisava  ser  repensado  para acompanhar  as  profundas  transformações  sociais impostas pelo novo modo de produção como o toyotismo.

Convém  ressaltar  que  as  pedagogias descritas  neste  tópico não  se  sucederam  de modo  linear,  como  afirma Saviani  (1987).  Em  pleno  século  XXI,  encontramos  na  escola brasileira  traços  da  pedagogia  tradicional,  influências  escolanovistas  e  práticas  educativas inspiradas no tecnicismo, todas com algo em comum: nenhuma delas isoladamente serve à nova  realidade  social  desenhada  pela  modernidade  líquida(BAUMAN,  2013),como abordaremos no tópico a seguir.

O século XXI e a busca por uma nova pedagogia

O ponto  de  partida  de  uma  teoria  pedagógica  é  sempre  um  problema  apresentado pela  realidade  educacional,  que por  sua  vez reflete a  realidade  social,  afirma  Aranha (2006). Uma pedagogia  para a  escola do século  XXI exige,  antes de tudo, compreender e refletir sobre a contemporaneidade. Para realizar essa tarefa, ancoramos nossos estudos nas ciências humanas  auxiliares da educação, mais precisamente as obras de  Harvey  (1992) e Bauman (2008; 2010;2013), salientando que este último propõe uma leitura sociológica da nossa sociedade pela qual é possível inferir como se encontra a nossa educação.

Harvey  (1992)sustenta  que a  condição  pós-moderna,  soba  égide  do  padrão  de acumulação    flexível, articula    um    conjunto    de    elementos    de continuidade e descontinuidade, criando algo distinto  do  padrão  taylorista/fordista  de  acumulação,  mas retendo o caráter essencialmente capitalista do modo de produção vigente e de seus pilares fundamentais. Segundo o autor, o Toyotismo propõe um confronto direto com a rigidez do fordismo por  meio  da  flexibilidade  dos  processos  de  trabalho,  dos  mercados  de  trabalho, dos produtos e padrões de consumo. A acumulação flexível foi acompanhada na ponta do consumo por  uma  atenção  muito  maior  às modas  fugazes  e  pela  mobilização  de  todos  os artifícios de indução de necessidades e de transformação cultural que isso implica.

Bauman  (2008; 2010; 2013)  complementa  essa  concepção sustentando  que  novos valores,  novas  necessidades,  novas  lógicas  operacionais,  novos  gostos  e  sentidos,  novas formas  de  consumo  e  de  gozo  do  tempo  livre e  até  mesmo  novas  personalidades são algumas  das  novidades  surgidas na modernidade  líquida, com a  velocidade  dos  mais modernos processadores de dados e informações.

Assim, tanto  a  condição  pós-moderna de  Harvey  (1992) quanto a modernidade líquida de  Bauman  (2013) são  expressões  usadas para  se  referirem ao  nosso  tempo, caracterizado pela sensação cada vez maior de que a nossa realidade contemporânea é leve, fluida,  instantânea, volátil  e  flexível.  Justamente por  força  dessas características a nossa realidade é  também  imprevisível, instável, descartável, passível  de  rápidas  e  profundas transformações. A  modernidade  líquida, no  pensamento  de  Bauman  (2013),  refere-se  a uma civilização  do  excesso,  do  dejeto  e  do  seu  descarte. Ao  contrário  da  modernidade sólida, construída sobre valores perenes e imutáveis, a sociedade em que vivemos valoriza o provisório e o imediato.

A  vida  líquido-moderna nos instiga  ao  constante movimento e  à  busca  por novidades,  de  modo  a evitar  que  qualquer  coisa  praticada  no  momento  se  transforme  em hábito. A modernidade líquida nos impõe a libertação do legado do próprio passado para usarmos a “identidade  atual  como  uma  camisa  que  pode  ser  prontamente substituída quando sai de moda, desdenhar das velhas lições e das antigas habilidades sem inibição ou remorso”(BAUMAN, 2013,  p.  36).A solidez  das  coisas e dos  vínculos  humanos é  vista como  ameaça. “Qualquer  compromisso  a  longo  prazo prenuncia  um  futuro  prenhe  de obrigações  que  limitam  a  liberdade  de  movimento  e  a  capacidade  de  perceber  novas oportunidades assim que elas se apresentarem”(BAUMAN, 2010, p. 40).

Isso    dificulta    sobremaneira    o    advento de    uma    nova    teoria    pedagógica, caracterizando  aquilo  que  denominamos  no  presente  trabalho  de  “limites”  de  uma pedagogia para a modernidade líquida. Bauman (2013) sustenta que o nosso mundo líquido exige  que  as  pessoas  esqueçam  hoje  o  que  aprenderam  ontem  e  aprendam  hoje  o  que devem esquecer amanhã.

Os limites de uma pedagogia para a modernidade líquida residem na constatação de que  os fins  da  educação escolar na  contemporaneidade são questionados,  os  valores subjacentes ao processo educacional são postos em xeque, as forças sociais que estruturam a  escola  na  atualidade  são  voláteis  e  efêmeras, o  papel  dos  atores  da  educação  escolar  se intercambia, de modo a impossibilitar uma definição precisa dos mesmos, os espaços e os tempos  educacionais se  transformam  com  tal  velocidade  que  impede  aos  sujeitos  da educação  apreender  os  sentidos  dessas  mudanças.  Tudo  isso resulta  num  inevitável sentimento de impotência diante do desafio de pensar uma pedagogia que sirva à essa nova realidade.

Teorizar sobre métodos que buscam a adaptação recíproca do conteúdo informativo aos indivíduos que se deseja formar significa também, conforme Bauman (2008, p. 177):

Teorizar um processo formativo que não é guiado desde o princípio pela forma  do alvo projetada de antemão; moldar sem conhecer ou visualizar claramente o modelo a ser atingido; um processo que pode, na melhor das hipóteses,  sugerir,  nunca  impor,  seus  resultados  e  que  constrói  essa limitação  em  sua  própria  estrutura;  em  resumo,  um  processo  com  final aberto,  mais  preocupado  em  permanecer  assim  do  que  com  qualquer resultado específico.

No  entanto,  Bauman (2013) não  se  mostra  pessimista ou  paralisado  frente  a  esses limites.  Quando  reflete  sobre  o futuro  do  sistema  educacional usa  a  figurados  mísseis inteligentes em  oposição  aos  mísseis  balísticos,  como  metáfora  para  as  possibilidades de uma pedagogia para a modernidade líquida. Os mísseis balísticos eram as armas ideais nas guerras  de  posição,  com  alvos  imóveis,  visto  que  aprendiam  antes de  serem  lançados  e jamais  se  esqueciam.  O  que  aprendiam  era  para  toda  a  vida,  como  de  fato  acontecia  nas relações  de  aprendizagem  na  modernidade  sólida.  Já  os  mísseis  inteligentes  são  as  armas do momento, usados para alvos móveis, razão pela qual aprendem no percurso e esquecem com  rapidez.  O  conhecimento  que  adquirem  é  eminentemente  descartável,  semelhante  ao que ocorre nas relações de aprendizagem da modernidade líquida.

Complementando esse raciocínio, Bauman (2013, p. 17)cita a teoria dos três níveis de aprendizagem, postulada por Gregory Bateson (1904-1980):

O nível mais baixo é a transferência de informação a ser memorizada. O segundo, a “deutério aprendizagem”, visa ao domínio de uma “estrutura cognitiva” à qual a informação adquirida ou encontrada no futuro  possa ser  absorvida  e  incorporada.  Mas  há  também  um  terceiro  nível,  que expressa  a  capacidade  de  desmontar  e  reorganizar  a  estrutura  cognitiva anterior ou desembaraçar-se totalmente dela, sem um elemento substituto.

O   terceiro   nível   se   transformou em   uma norma no   processo   de   ensino e aprendizagem  da  modernidade  líquida  e  vem  impondo  uma  revisão  radical  da  estrutura cognitiva   do   sujeito   que   aprende.   Trata-se, por   conseguinte,   de   um   momento revolucionário, de uma crise paradigmática que “tem pouco a ver com as faltas, os erros e a negligência   dos   pedagogos   profissionais,   tampouco   com   os   fracassos   da   teoria educacional” (BAUMAN, 2008, p. 163).

Há  motivos  para  preocupação,  mas  não  para  desespero.  Todo e  qualquer  processo de  construção  cultural  resulta da  combinação  do  destino  e  do  caráter,  de  modo  que  o  ser humano  é  o  responsável  pela  construção  do  seu  presente  e  do seu futuro.  “O  destino delineia  o  conjunto  de  opções  viáveis,  mas  é  o  caráter  que  as  seleciona, escolhendo algumas  e  rejeitando  outras.  Não há  situação  que  não  contenha  mais  de  uma  opção” (BAUMAN, 2013, p. 27). Não existe, portanto, situação sem escolha.  

Bauman (2013) adverte  que, para  fazermos uso  adequado da liberdade de escolha, precisamos  ter  consciência  das  possibilidades  oferecidas pelo  destino  e  do  conjunto  de ações  alternativas  dentre  as  quais  escolher. Se  o principal propósito  da escolarização é  preparar as gerações vindouras para as realidades que tenderão a enfrentar, uma pedagogia para o século XXI, deve cultivar, dentre outras coisas, na visão de Bauman (2008, p. 176-177):

A capacidade de conviver em paz com a incerteza e a ambivalência, com uma  variedade  de  pontos  de  vista  e  com  a  ausência  de  autoridades confiáveis e infalíveis; deve significar tolerância em relação à diferença e vontade  de  respeitar  o  direito  de  ser  diferente;  deve  significar  fortalecer as faculdades críticas e autocríticas e a coragem necessária para assumir a responsabilidade  pelas  escolhas  de  cada  um  e  suas  consequências;  deve significar  treinar  a  capacidade  de  “mudar  os  marcos”  e  de  resistir  à tentação de fugir da liberdade, pois com a ansiedade da indecisão ela traz também as alegrias do novo e do inexplorado.

A  realidade  social  analisada  e  discutida  neste  tópico nos  mostrou os  principais problemas  da  escolarização  na  modernidade  líquida,  a  partir  dos  quais  podemos  pensar alternativas  pedagógicas. Esse  é  o  primeiro  passo  para  a  construção  de  uma  pedagogia,  a partir do qual podemos refletir sobre as possibilidades de estabelecer objetivos realizáveis, buscar  os  meios  para  atingi-los,  verificar  sua  eficácia  e rever  os  processos  utilizados na transmissão  do  legado  cultural  às  gerações  vindouras,  sempre com  a  finalidade  de aperfeiçoá-los.

Conclusão

As  pedagogias  predominantes  no  século  XX,  que  nos  forneceram   diferentes possibilidades  de  educação  escolar, já não  servem  mais,  fato  que  dificulta  (ou  até  mesmo inviabiliza) o trabalho de transmissão do legado  cultural da humanidade  às gerações mais novas.

Exatamente   na   medida   em   que   não   mais   podemos   identificar   um paradigma  dominante  em  nosso  contexto  de  pensamento –referência básica  para  nossos  projetos  científicos,  políticos,  éticos, pedagógico se mesmo estéticos –é que nos caracterizamos como vivendo uma crise de paradigmas,   e   até   mesmo   uma   crise   da   própria   necessidade   e possibilidade  de  um  paradigma  hegemônico  (MARCONDES,  1996,  p. 28, grifo nosso).

Por outro lado, aprendemos com a história que períodos de crise são extremamente férteis  para  a  sociedade, pois nesses  períodos  reconhecemos os  limites e  criamos novas possibilidades de  enfrentamento  da realidade, por  meio  das quais  podemos discutir  uma nova pedagogia para a educação escolar da modernidade líquida.  

Nosso  objetivo,  com  o  presente  estudo,  foi identificar  as  características  que uma teoria  pedagógica  deve  ter  para  atender  às  demandas que  recaem  sobre  a  escola  no momento  histórico  em  que  vivemos. Tal  pesquisa  bibliográfica,  de  caráter  teórico-descritivo,  permite-nos  concluir que,  de  acordo  com  Bauman  (2008,  2010,  2013),  na modernidade  líquida  qualquer  proposta  pedagógica,  para ser  possível  e  viável, precisa desenvolver   no aprendiza   capacidade   de   conviver   em   paz   com   a   incerteza   e   a ambivalência. Precisa também  desenvolver  o  senso  de  tolerância  e  respeito  às  diferenças em um mundo em que as autoridades são cada vez menos confiáveis e as lideranças  cada vez mais falíveis. A pedagogia do século XXI precisa fortalecer o senso crítico do aprendiz para proporcionara capacidade de  assumir  a  responsabilidade  por  suas escolhas e as consequências pelos próprios atos.  Por  fim,  a  pedagogia  da  modernidade  líquida precisa  desenvolver a habilidade de resistir à tentação de fugir da liberdade.

Estes  são  os  fundamentos  de  uma  pedagogia  para  a  modernidade  líquida,  com  os seus  limites  e  suas  possibilidades.  Tais  fundamentos  revelam os  desafios  que  a educação escolar tem pela frente, caso queira continuar existindo como uma instituição fundamental para a formação das gerações vindouras. A nossa expectativa é de que este trabalho possa inspirar investigações mais profundas e consistentes acerca da problemática aqui discutida.

Cientes    de    que    não    há    espaço    para    pessimismo    ou    imobilismo, e independentemente  das  adversidades  impostas  pela  modernidade  líquida,  a  educação escolar terá que ser reinventada para estar a serviço da nova sociedade que emerge no seio da  velha  ordem  até  então  dominante,  tendo  sempre  em  mente que  é  pela  escola  que precisamos recomeçar.

Referências

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LIMITES E POSSIBILIDADES DE UMA PEDAGOGIA PARA A MODERNIDADE LÍQUIDA

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